31 de maio — Santa Joana d’Arc, a Virgem de Orléans († 1431)

Extraído de uma edição de 1928 do livro “Na Luz Perpétua — Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus, para todos os dias do ano, apresentadas ao povo cristão” 1

FIGURA singularíssima entre os Santos é Joana d’Arc, a humilde camponesa de Domrémy, que, chamada por Deus, libertou sua terra, a França, do jugo dos estrangeiros para, como mártir de sua missão, terminar sua vida numa fogueira.

Filha de pobres camponeses de Domrémy, na Lorena, nasceu Joana em 6 de janeiro de 1412. Longe dos grandes centros da civilização e da política, recebeu Joana a educação que os bons e piedosos camponeses têm por costume dar a seus filhos, e assim a menina cresceu em simplicidade, piedade e temor de Deus, em nada se distinguindo das suas companheiras a não ser por uma piedade mais acentuada e acendrada, como também por uma compaixão extraordinária pelos pobres. Entrando na idade de 13 anos, começou para Joana uma nova época em sua vida. Por diversas vezes, a menina ouviu vozes celestiais e apareceram-lhe o arcanjo São Miguel e outros anjos, que a prepararam para a grande e extraordinária missão, para a qual Deus a tinha destinado.

Tristíssima, ou antes, desesperada, era a situação da França, cujo governo estava nas mãos de Carlos VII. O norte do país estava sob o poder dos ingleses, tendo ficado Carlos VII senhor apenas dos estados ao sul do Loire. Com o sítio de Orléans, os ingleses ameaçavam apoderar-se também do resto da França. O chamamento de Joana coincide com este período humilhante da monarquia francesa. O que as vozes angélicas exigiam de Joana, não era nada menos que salvar a França, libertar Orléans e conduzir o rei a Reims para ser solenemente coroado. Tarefa aparentemente impossível para uma pobre e fraca donzela, além de tudo inexperiente e tímida. Mas as vozes tornaram-se cada vez mais insistentes e exigiram de Joana o mais pronto cumprimento da vontade de Deus. Visões que teve também de Santa Catarina e Santa Margarida, animaram-na a não se opor aos planos divinos.

Enormes, quase insuperáveis dificuldades se levantaram diante de Joana, quando esta revelou sua resolução à família. Dificuldades de outra espécie surgiram, quando Joana, em nome de Deus, exigiu ser em audiência recebida pelo rei. Este só se convenceu da missão sobrenatural da donzela, quando esta lhe revelou um segredo só por ele e por Deus conhecido. Ainda assim o monarca providenciou a mais severa observação, mas todos — homens e mulheres — foram unânimes em declarar e depor que em Joana não havia nada de exagero ou fraudulento. Joana designou um altar da igreja de Santa Catarina de Fierbois, debaixo do qual se acharia uma espada de que se deveria servir na campanha contra os ingleses. A espada foi de fato encontrada. Profecias por ela enunciadas cumpriram-se ao pé da letra, principalmente esta, que predizia seu ferimento no assédio de Orléans. Os ingleses foram rechaçados, Orléans foi libertada e Joana levou o rei em triunfo a Reims, onde se realizou a coroação do monarca. Desde o princípio de sua atividade tinha sido a declaração positiva de Joana, que realizada a coroação do rei em Reims, consideraria terminada sua missão. Seu desejo era então voltar para o seio de sua família. O rei, porém, não consentiu na sua retirada e exigiu de Joana que continuasse no seu posto de comandar as tropas. Se Joana tinha preparado para o rei sua solene coroação, outra coroa a esperava, a do martírio. Na batalha de Compiègne, caiu nas mãos dos ingleses, que a encarceraram no forte de Beaurevoir, perto de Cambrai. Infeliz numa tentativa de fuga, foi encontrada desacordada pelos inimigos, que a levaram novamente à prisão. Instalou-se então o processo contra a heroína. Rodeada só de inimigos, abandonada pelo seu próprio rei, que tanto lhe devia, foi Joana julgada por um tribunal iníquo, presidido pelo bispo Pedro Cauchon de Beauvais, que outro interesse não conhecia senão ser agradável aos ingleses. Sem ter um advogado, que defendesse sua causa; sem que fossem ouvidas os seus protestos e sua solene apelação à Santa Sé, Joana foi condenada à morte de fogueira. Na hora solene de sua execução (30 de maio de 1431) Joana se houve em toda sua grandeza e dignidade. Heroína fora na vida, como heroína morreu, invocando o nome de Jesus.

«Estamos perdidos nós todos, exclamou um oficial inglês que assistira àquela cena, pois ela é uma santa. Os soldados, habituados à vida rude de guerreiro, enxergavam em Joana «um ser angélico em cuja presença ninguém se atrevia a dizer ou praticar inconveniências.» Joana não permitia a blasfêmia entre os soldados e mantinha entre eles a mais rigorosa disciplina. Ela mesma confessava-se quase diariamente e, além dos sacrifícios e privações que a vida no acampamento lhe impunha, praticava o jejum e a abstinência com muito rigor. Sua família requereu revisão do processo junto à Santa Sé para que fosse reabilitada a inocência da grande heroína. A Santa Sé anuiu a este justo pedido, e o Papa Calisto III não só anulou o processo de Rouen, como também declarou solenemente a inocência de Joana. Pio X beatificou-a em 10 de abril de 1909. Em 1920, foi Joana inserida no catálogo dos Santos por Sua Santidade Bento XV, na presença de milhares de cristãos e sob o entusiasmo mais justo de todos os católicos da França e do mundo inteiro.

REFLEXÕES

Incompreensíveis são os juízos de Deus, e inescrutáveis, os seus caminhos. De um modo admirável, Deus se interessa pelos destinos de uma nação. Para defender os direitos de um rei, de um rei indigno, recorre à intervenção de uma pobre donzela, e esta morre vítima de um processo iníquo. “Quem já conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro?” (Romanos 11, 34).

Notas

  1. PDF desse livro disponível em: https://archive.org/details/pe-joao-baptista-lehmann-na-luz-perpetua-vol-i_202312