23 de fevereiro — São Pedro Damião, Bispo, Confessor e Doutor da Igreja23 de fevereiro — São Pedro Damião, Bispo, Confessor e Doutor da Igreja

Extraído de uma edição de 1928 do livro “Na Luz Perpétua — Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus, para todos os dias do ano, apresentadas ao povo cristão” 1

São Pedro Damião, Cardeal e Doutor da Igreja, nasceu pelos fins do ano de 1006, ou em começo de 1007, em Ravena. Com receio de ser parcelada demais a fortuna da família, em virtude da prole numerosa, sua mãe expô-lo, retomando-o pouco depois. Pedro perdeu os pais muito cedo e ficou debaixo das ordens de um irmão mais velho, que o tratava com muita dureza e sem a menor caridade. Tendo 10 anos, sua sorte melhorou. Um outro irmão, Damião, que era arcipreste em Ravena, recebeu-o em sua casa, introduziu-o no estudo das ciências e foi para ele um pai carinhoso. Para mostrar sua gratidão, Pedro adotou o cognome de Damião. Durante alguns anos, teve por professores esse seu irmão e um outro sacerdote. Mais tarde continuou seus estudos em Faenza e Parma. Nesta última cidade e depois em Ravena exerceu o cargo de professor. Em todo este tempo realizou-se em sua alma grande mudança. Tendo 28 anos, fez-se monge do eremitério de Fonte Avellana, na diocese de Faenza. Com a dedicação, a mais extremada, trabalhou na sua santificação, lançando os alicerces de uma vida ascética, que não mais largou até à morte. Tanto se afeiçoou a Fonte Avellana, que precisou da ameaça de excomunhão para determiná-lo a aceitar a púrpura. Diversos outros mosteiros convidaram a Pedro para pregações e para reformá-los em seu espírito. Morto o prior de Fonte Avellana, foi Pedro eleito seu sucessor. Como Superior, dirigiu toda a sua atenção à formação de um bom espírito ascético nas comunidades. Para este fim, escreveu as biografias dos Santos Odilon, Romualdo, Domingos Loricato e Rodolfo de Gúbio, que apresentavam aos monges exemplos perfeitos da vida religiosa.

Pedro não podia ficar indiferente diante da situação triste em que se achava a Igreja Católica. A Sé Apostólica tinha se tornado objeto de aspirações ambiciosas e se achava em certa dependência da casa imperial da Alemanha. Em condições análogas estavam as dignidades eclesiásticas na Itália, França e Alemanha. Os prepotentes da política vendiam-nas a troco de dinheiro ou davam-nas às suas criaturas. Grande parte do clero tinha-se esquecido de sua alta missão, e estava entregue ao vício da simonia ou do nicolaitismo2. O povo cristão estava sem guias e o espírito da impiedade se alastrava cada vez mais.

Pedro Damião se opôs com toda a força a este estado de coisas. Pôs-se em comunicação direta com os Papas Gregório VI, Clemente II, Leão IX, Estêvão IX e Nicolau II, e conseguiu que se abrisse forte campanha contra os dois abusos que tanto prejudicavam a obra de Cristo na terra.

Ele mesmo escreveu duas monografias, em que tratou das duas chagas perniciosas no corpo da Igreja. A segunda publicação contra o Nicolaitismo, criou-lhe muitos adversários, por causa do assunto e do modo franco e enérgico com que desvendou e atacou o mal. O Papa Estêvão IX, porém, nomeou o autor Bispo e Cardeal de Óstia, dignidade com que se achava ligada outra, de Decano do Colégio Cardinalício.

Grandiosa foi a atividade de Pedro Damião na reforma religiosa em muitas dioceses. Comissões dificílimas e bem melindrosas foram-lhe confiadas pelos Papas, e sua prudência, energia e caridade conseguiram os mais brilhantes resultados. Foi este o motivo por que os Papas tão pouca disposição mostraram de aceitar seu reiterado pedido de exoneração para poder voltar ao seu querido eremitério. Muito bem fez a Santa Sé em não ter-se privado da cooperação de tão hábil diplomata e santo reformador. A política abusiva do partido imperial, na eleição do sucessor de Nicolau II (1061), necessitava de um regulador prudente e enérgico, da têmpera de um Pedro Damião.

Em muitas questões difíceis e melindrosas, quer entre diocesanos e a autoridade diocesana, quer entre religiosos e Bispos, era decisivo o seu arbítrio.

Tendo 62 anos de idade, foi enviado ao “Reichstag” de Frankfurt para, na qualidade de delegado pontifício, protestar contra o projeto do imperador Henrique IV de se divorciar da sua legítima esposa.

O Arcebispo de Ravena tinha incorrido na excomunhão e morrido sem absolvição. Reinava na cidade forte animosidade contra Roma. Pedro Damião acalmou os espíritos e restabeleceu a paz. Foi esta a última obra do Santo na sua vida. Ansioso para procurar o merecido descanso em Fonte Avellana, morreu na viagem, em Faenza, no ano de 1072, tendo 65 anos de idade.

São Pedro Damião é enumerado entre as figuras mais eminentes de todos os tempos. Ele foi grande como sábio, religioso, sacerdote e cardeal. Admiráveis e fora do comum foram seus conhecimentos, principalmente na jurisprudência; admirável foi a franqueza apostólica, com que profligava os vícios do seu tempo; admirável a austeridade e santidade de sua vida; admirável sua piedade e zelo sacerdotal; admiráveis, enfim, foram a dedicação incondicional à Santa Sé e seu entusiasmo e atividade pela prosperidade da Igreja.

O corpo do grande Santo descansa na Igreja dos Cistercienses, em Faenza. Papa Leão XII deu a São Pedro o título honroso de Doutor da Igreja.

Reflexões

1. “Por que não pensas seriamente no negócio de tua salvação?” Costumava São Pedro perguntar-se a si mesmo. A mesma pergunta devíamos dirigir a nós, sendo a salvação da nossa alma o que mais nos devia interessar. Salva a alma, tudo está bem; perdida a alma, tudo está perdido. Muitos há, e estes pertencem à maioria, que põem esta questão em último plano, considerando-a a mais insignificante de todas as outras e a menos importante. Jesus Cristo pensa diferentemente. “Marta, Marta, — disse Ele à irmã de Maria — estás te preocupando com muitas coisas, quando apenas uma é necessária” (Lucas 10, 41-42). A salvação da alma é de todos os negócios o mais importante; é o negócio dos negócios; por isto merece nossa maior atenção, o máximo cuidado da nossa parte.

2. “A vida é curta e seu curso veloz”, diz a Sagrada Escritura. Se a vida é curta, e sua passagem rápida, cumpre aproveitá-la para não perder nenhum dia, nenhuma hora. O tempo que se perdeu, perdido está para sempre. Uma eternidade não nos pode restituir o que no tempo perdemos. “Perdido uma vez o tempo, que Deus na sua bondade nos concedeu para fazermos penitência, e trabalhar para a nossa salvação, nunca mais o recuperemos” (São Boaventura).

Notas

  1. PDF desse livro disponível em: https://archive.org/details/pe-joao-baptista-lehmann-na-luz-perpetua-vol-i_202312 
  2. Simonia é a intenção manifesta de comprar ou vender bens sobrenaturais ou naturais a estes anexos. Nicolaitismo é a negação do celibato do clero